Nos últimos meses, uma novidade que brotou nas nossas timelines trouxe dúvidas (e algum ânimo) para as redes sociais. Alguns usuários começaram a anunciar que estavam criando seus perfis numa nova rede social – o Tsü (que pronuncia-se como o nome em inglês “Sue“). Mas afinal: o que é Tsü e porque essa plataforma está fazendo com que as outras redes se movimentem – inclusive o todo-poderoso Facebook?
O Tsü não é tão novo assim. Surgiu em outubro de 2014 com a proposta de ser uma rede social gratuita que remunera seus usuários com os lucros obtidos por meio da exposição de publicidade, patrocínio e parcerias. Usando um sistema de carteira eletrônica, os usuários podem gerar lucros, resgatar valores (quando estes superarem a quantia de U$ 100,00) e até repassar dividendos para outras contas.
A adesão ao Tsü lembra o formato da rede social Ello: você precisa do convite de uma pessoa para fazer parte. A diferença é que não há necessidade de contar com o convite de alguém propriamente: basta apontar o shortcode de quem levou você ao site (este shortcode nada mais é do que a url do perfil dessa pessoa). Ou seja, você mesmo pode apontar o contato através do qual tomou conhecimento da rede e se inscrever.
Esta lógica é extremamente relevante no uso do Tsü porque a remuneração paga aos usuários funciona no esquema de “árvore genealógica”. Digamos que você poste na rede um artigo, uma foto sua ou um vídeo que filmou. De todo o lucro gerado por esse post, 10% vão para a manutenção do site. Dos 90% restantes, metade vai para o criador do conteúdo (você). 33,3% vão para o usuário que compartilha “em 1º grau” o conteúdo. 11,1% para quem compartilha em 2º grau. 3,70% para quem compartilha em 3º, e por aí vai.
“E POR AÍ VAI”?!
Sim. Terminar uma descrição de remuneração com “etc” ou com “e por aí vai” é um abuso de malandragem. Mas a verdade é que não há forma melhor de terminar esta descrição porque, de fato, a “fórmula mágica” do Tsü é uma incógnita ainda. Essa lógica da árvore genealógica fica bem mais confusa quando se imagina que um post pode ser compartilhado por 10, 100, 1000 pessoas – todas em 1º grau, dependendo do caso. E que cada uma delas gera diferentes compartilhamentos em 2º, 3º, 4º grau. Além disso, o site apresenta nos “Termos do Serviço de Monetização e de Carteira Eletrônica” uma cláusula de confidencialidade, segundo a qual o usuário aceita não divulgar informações sobre CTR (click through rate) e custo por impressão de publicidade. O cálculo da conversão de verba de patrocínio ou publicidade em remuneração é feito com base em um algoritmo próprio e secreto. Todo mundo que trabalha com mídias sociais já sente aquele arrepio ou ler o termo “algoritmo secreto” depois de experiências confusas com outras redes como Facebook e Twitter.
Mas o que o site se propõe a explicar – e o que parece ser suficiente para ser entendido pelo produtores de conteúdo que lá estão – é que:
- Quanto maior a sua rede no Tsü, mais chances você tem de conseguir lucro. Lá, você pode montar uma rede de usuários indicados, amigos e seguidores que potencializa o alcance dos seus posts e suas chances de lucro.
- Eles incentivam a produção de conteúdo original. O site se reserva o direito de remover qualquer lucro inserido na carteira eletrônica de qualquer usuário que seja oriundo de produtores terceiros. Ou seja: quem postar conteúdo cujos direitos já sejam registrados para outro usuário ou outas plataformas fica sem o lucro. O mesmo ocorre diante de uma tentativa de gerar lucro por meio de acessos de robôs a um determinado perfil. Assim, o Tsü incentiva a produção de conteúdo próprio e o tráfego orgânico por ela.
A FACA E O QUEIJO ESTÃO NA MÃO. SÓ FALTA EXECUTAR DIREITO.
A proposta do Tsü cai como uma luva para produtores de conteúdo. Com grandes meios de comunicação em crise abrindo espaço para novas iniciativas e plataformas, um espaço gratuito onde um usuário pode garantir algum lucro sobre seu conteúdo produzido é uma bênção. Mesmo o Brasil, com seu número de micro-empreendedores crescendo exponencialmente, é um território fértil para uma iniciativa como essa. Por esses e outros motivos, o próprio Facebook andou tomando providências para evitar a expansão do Tsü por meio das suas páginas. O site bloqueou postagens que linkassem o site (inclusive mensagens com links enviadas via messenger) e desativou a API criada para conectar usuários do Tsu que fossem amigos no Facebook. O caso de censura mais icônico foi a postagem de um vídeo promocional feita pelo rapper 50 Cent em sua página do Facebook. Lá, ele conta com mais de 38 milhões de curtidas. Mas optou por linkar no post do vídeo a sua página do Tsü, onde já conta com mais de 131 mil seguidores também. Resultado: o post foi deletado.
A ação acabou indo parar na mídia e, dessa forma, provavelmente fez com que mais pessoas tomassem conhecimento do Tsü. Isso mostra o poder de alcance de uma proposta que envolva remuneração aos produtores de conteúdo como a do Tsü. Mas a rede social pode escorregar na sua relação com os usuários se não tomar cuidado. E o mesmo pode ser dito dos próprios usuários que não forem cautelosos. Entenda:
NÃO HÁ PLANEJAMENTO QUANDO O JOGO É FECHADO.
Como dito acima, alguns detalhes sobre a forma de remuneração do Tsü ainda são turvos. Quem pensa em fazer da plataforma sua fonte de riquezas pode até atingir seu objetivo, mas certamente será pisando em ovos, porque não se pode criar uma meta segura de textos ou vídeos, por exemplo, quando o potencial de lucratividade deles é incerto. Um bom exemplo de como essa situação pode funcionar como ameaça aos produtores de conteúdo é a nova investida do YouTube com o lançamento do YouTube Red. Como bem apontado nesta reportagem do Estadão, as incertezas e mudanças no formato de remuneração da plataforma estão deixando até os produtores mais consagrados de cabelo em pé e coração palpitando.
OS SPAMS SÃO REAIS E ESTÃO LÁ.
Já é possível ver perfis e postagens no Tsü que apelam para marcações na linha “troco likes” e “sigo de volta” para conquistar seguidores e compartilhamentos. A rede social que se vende como “a solução que vai devolver a propriedade do conteúdo aos seus donos” e que incentiva a produção de conteúdo original e de qualidade, no final das contas, vai precisar se virar nos 30 (mais do que está se virando) para contornar os spammers e robôs. O Tsü aponta em suas regras que conteúdos ofensivos, obscenos, pornográficos ou vulgares não terão seus lucros repassados aos autores – ou podem ter seus lucros devolvidos, caso as postagens sejam encaixadas em uma dessas categorias posteriormente. Mas até que ponto a rede se manterá fiel à proposta de difusão de conteúdo de qualidade podendo ceder aos números que tais conteúdos podem trazer? Uma vez que postados, esses conteúdos podem não ser revertidos em lucros para os usuários, mas terão exibido publicidade e, logo, terão gerado lucro para a rede.
NADA DURA PARA SEMPRE.
Se já é difícil se planejar a curto prazo com um modelo de remuneração às escuras, imagine se planejar a longo prazo? A tendência com o passar dos anos é que conforme o número de usuários do Tsü aumente o modelo de remuneração passe por mudanças. A remuneração, por sua vez, tende a ser cada vez mais difusa por uma rede cada vez maior de usuários. Mesmo que os 45% do lucro sobre um conteúdo continuem direcionados ao seu autor, a relação audiência x lucro será cada vez mais predatória e desafiadora, como acontece com a maioria dos esquemas de lucro em pirâmide (modelo ao qual o Tsü não se aplica, mas ao qual ele se assemelha). Trocando em miúdos: será preciso atingir cada vez mais pessoas para conquistar seu primeiro 1 dólar. O dinheiro que já é difícil hoje tende a ficar mais difícil com o tempo.
MAS AINDA É CEDO.
Não dá pra bater o martelo quanto ao sucesso ou fracasso do Tsü. Um ano é pouco tempo para avaliar o potencial de adaptação da rede aos diferentes mercados e às provações que só a internet pode impor a novas iniciativas como essa. O que é certo é que trata-se de uma proposta tentadora, que tem tudo para ganhar espaço na rotina dos produtores de conteúdo. O que vai determinar o sucesso do Tsü é sua capacidade de contornar os oportunismos e, principalmente, sua transparência nas relações com o usuário.
Nenhum comentário:
Postar um comentário